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segunda-feira, maio 20, 2024

Ostentação de milionários e novos ricos nas redes sociais se tornou compulsiva, doentia e obscena

Vai ter um monte de gente dizendo que este artigo é “pura inveja” e cada um usa o dinheiro ganho com o próprio trabalho da forma que bem entender. Com certeza, gente pobre e modesta, em sua maioria, daquela que sonha em um dia poder, quem sabe, ganhar na loteria e ter o direito de agir da mesma maneira estúpida e superficial. Paciência.

Eu tenho certeza: o nível de ostentação que tomou conta dos novos ricos e bilionários ultrapassa o bom senso e o despudor. Atualizaram a definição de falta de vergonha na cara e excesso de cafonice. Zero empatia com os milhões de seres humanos normais que pagam boletos e, por mais que trabalhem e tenham talento, vivem em dificuldade, um dia após o outro. Indecente.

O mundo sempre teve gente muito, muito rica. Imperadores, faraós, reis e rainhas com seus palácios, pirâmides e toda uma aristocracia exuberante, esnobe, com seus escravos e criadagem. Vários foram decapitados ou expulsos da civilização por hordas esfomeadas em fúria.

Mas este século 21 adotou um padrão de riqueza e acumulação de dinheiro em poucas mãos que beira a insanidade – a ponto de alguns cientistas sociais (de vários matizes ideológicos) associarem a gigantesca concentração de renda como a crise mais séria a ser enfrentada pelo capitalismo.

O ranking da Forbes de 2023 listou 2.640 bilionários dispersos em 77 países ao redor do mundo. Juntos, não lotam o Teatro Acadêmico da Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende, Rio de Janeiro, que possui 2.825 cadeiras. Os 62 bilionários brasileiros cabem num ônibus articulado comum, todos sentados.

Foi-se o tempo em que o termo elite referia-se ao que a humanidade produzia de melhor. Hoje, é uma palavra que perdeu o sentido e o significado. Riqueza não vem acompanhada de bom gosto, elegância e, tampouco mérito. Os mais abastados parecem ter formado um cartel em que se destacam a futilidade, o supérfluo, o extravagante e o exibicionismo – quando não, a cafajestagem. É só tapa na cara da sociedade.

Riqueza com elegância e discrição

As exceções são raras. Entre elas, o polêmico e muito criticado Elon Musk – fundador da Tesla e da Space X, com fortuna estimada de mais de US$ 160 bilhões – resolveu se mudar para uma casa pré-fabricada avaliada em cerca de US$ 70 mil (pouco mais que o preço de um apartamento de baixo padrão do Minha Casa Minha Vida).

O fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, usa calça jeans e camiseta e dirigiu um Honda Fit. Bill Gates, em vida, já doou 94% de sua fortuna para fundações beneficentes. Ele diz que com a restante da herança, até seus tataranetos vão ter uma vida de luxo. Já o ator Keanu Reeves prefere voos comerciais e é frequentemente visto no tranporte público de Los Angeles.

Esse estilo de vida mais discreto (e exemplar) era uma tradição dos ricaços brasileiros até pouco tempo atrás. Um grande personagem foi o megaempresário Antonio Ermírio de Moraes, que usava ternos quase puídos, pagou do próprio bolso e dirigiu pessoalmente o Hospital Beneficência Portuguesa (SP) e muito raramente ia a festas.

Francesco Matarazzo, criador do maior complexo industrial da América Latina no início do século 20, Roberto Marinho, pai, e Silvio Santos são outros abastados que se enquadram nesse padrão de discrição e vida privada sem holofotes.

Pelo visto, no aspecto comportamental, não deixam herdeiros. Ricos pedantes e presunçosos, claro, sempre existiram. Mas nada que se compare ao que presenciamos de uma década para cá. A regra se inverteu, provavelmente por conta do fenômeno das redes sociais. O que vale agora é a espetacularização da riqueza, a ostentação obscena e a vaidade mais patológica.

O advento dos “influenciadores” digitais tornou tudo mais desmesurado e grotesco. Não há limites para a exibição compulsiva do supérfluo, do excessivo, da barbaridade. Virou uma gincana sem fim entre os afortunados a disputa por cliques em que são exibidos iates, aviões, jatos, mansões, joias, roupas de grife, carros exclusivos, lugares extravagantes – desde que representem números astronômicos fora do alcance de 99,% do que sobra da raça humana.

Fenômeno internacional

É até desonesto citar figuras que agem desta forma, pois basta ser milionário para agir dentro desse protocolo de estupidez e babaquice. Mas, no Brasil, a síntese dessa empolação é o jogador Neymar. Ele faz questão de postar a vista aérea de uma de suas mansões, a de Mangaratiba, com pista de kart e lago artificial – mesmo a obra tendo sido autuada por ilegalidades ambientais, com direito até a voz de prisão ao pai do atleta. O que deveria ser motivo de vergonha se torna ativo de marketing pessoal.

O filho do cantor Leonardo ganhou de aniversário (25 anos) um a-vi-ão estimado em R$ 18 milhões. Presente da jovem esposa. Acho que antes de o meninão pisar na aeronave, a foto da “lembrancinha” já estava na internet. Para delírio da plateia, que fique bem claro. Há imensa demanda (masoquista) por esse pesadelo consumista e perdulário.

Embora os esbanjadores brasileiros sejam peculiares, trata-se de um fenômeno internacional. Nossa sociedade atual é pródiga em criar milionários do nada ou de profissões que antigamente eram exercidas por pessoas famosas, bem de vida, mas menos vulgares. O pessoal do futebol (e esportistas, em geral) lideram o rol. Para cada Sadio Mané – o senegalês do Bayern de Munique pródigo em doações para os pobres de seus país –, há centenas de Cristianos Ronaldos, com suas infantis coleções de carros de luxo e outras quinquilharias estapafúrdias.

O ator Will Smith divulgou fotos de seu motorhome (estimado R$ 13 milhões). O brinquedinho tem dois andares, visual luxuoso e mais espaço do que muitas casas: são 111,5 m² e 16,7 m de comprimento. Beyoncé e Jay-Z compraram uma propriedade de quase R$ 1 bilhão em Malibu. É a propriedade mais cara do Leste dos EUA. A nova morada do casal tem 2.800 m².

E por aí vai. Bolsas de R$ 30 mil, tênis esbugalhado por R$ 10 mil, hospedagens com diárias equivalente ao preço de um apartamento, intervenções estéticas que custariam uma vida inteira de salários de um trabalhador. Tudo esfregado nas fuças do mundo, diariamente, de forma doentia, tóxica, irreversível. E o cometa que não chega nunca…

Fonte: R7 – Resumo

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