O Ministério Público de São Paulo (MPSP) quer impedir as Câmaras de Vereadores de utilizarem, na abertura dos trabalhos, qualquer referência a Deus. A Promotoria já entrou com ações contra Câmaras de sete cidades e já obteve sucesso em algumas delas.
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O alvo mais recente é a Câmara de São José do Rio Preto, no interior do Estado. O procurador-geral, Mario Luiz Sarrubbo, quer invalidar o regimento interno da Casa Legislativa, no qual está previsto que o presidente deve dizer “sob a proteção de Deus iniciamos nossos trabalhos”.
Para a Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ), a frase — semelhante à que consta do preâmbulo da Constituição Federal — é inconstitucional. Na abertura da Carta Magna está escrito: “… promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil”.
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O fundamento de Sarrubbo é que “o Estado brasileiro é laico e garante a pluralidade de crenças” e, ao invocar Deus nas sessões, o Poder Legislativo cria uma exclusividade religiosa aos cristãos “alijando outras crenças presentes tradicionalmente no tecido social brasileiro como a judaica, a muçulmana, etc, bem como de outras que não ostentem essa percolação, justamente à vista da laicidade do Estado brasileiro”.
TJSP proibiu que Bíblia ficasse aberta na Câmara de Araraquara
Segundo o Estadão, desde 2019, o MPSP questionou judicialmente os regimentos internos das Câmaras de outras seis cidades: São Carlos, Araraquara, Itapecerica da Serra, Taquaritinga, Araçatuba e Catanduva. E já ganhou alguns casos.
Em novembro de 2023, o Tribunal de Justiça determinou que a Câmara de Araraquara parasse com citações bíblicas no começo das sessões e proibiu também que a Bíblia permanecesse aberta durante os trabalhos em plenário.
Antes, em maio, o TJ proibiu a Câmara de Araçatuba mencionar Deus no início da sessão e a leitura de um trecho bíblico por até três minutos. Para o desembargador Tarcísio Ferreira Vianna Cotrim, essas práticas podem “tolher de seus cidadãos o direito e a liberdade de escolher a orientação religiosa que melhor lhes aprouver ou mesmo de optar por se abster de professar qualquer tipo de crença”.
Especialista afirma que há equívoco na ação ‘contra Deus’ do Ministério Público de SP
Em entrevista à Gazeta do Povo, o advogado Igor Costa, mestre em Direito Constitucional, afirmou que a investida do Ministério Público de São Paulo contra as Câmaras se fundamenta no equívoco entre os conceitos de laicismo e laicidade. Segundo ele, “o Brasil, pela sua Constituição, é um país laico e não laicista”.
A laicidade, segundo ele, coloca o Estado em uma posição de neutralidade em relação às religiões, o que leva ao respeito a todos os tipos de crença e linhas de pensamento, sem proibir a manifestação pública de qualquer uma delas. Já o laicismo combate a profissão pública de qualquer crença, seja ela qual for, o que fere o direito constitucional à liberdade religiosa.
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O especialista afirmou que no Brasil, como a maioria da população é cristã ou temente a Deus, é natural o uso de símbolos religiosos ou frases de textos considerados sagrados. “A tentativa de retirar as expressões religiosas e a religião do espaço público é igualmente laicismo e, portanto, inconstitucional”, disse à Gazeta.
Câmara também destacou diferença entre laicidade e laicismo
Na defesa contra a ação de Sarrubbo, a Câmara Municipal de São José do Rio Preto também falou sobre a diferença entre laicismo e laicidade. “Não há como negar a esse respeito, a marcante contribuição do catolicismo para a formação espiritual, moral e cultural do povo brasileiro.”
Para a instituição, está claro que a questão levantada pelo Ministério Público não tem relevância jurídica, pois não impede a participação de qualquer cidadão nas questões políticas municipais.
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Nesse sentido, Costa disse que o Estado deve aceitar a pluralidade de religiões, proteger as crenças minoritárias e considera natural que a religião majoritariamente adotada pela sociedade receba destaque na vida pública.
Ao Estadão, o presidente da Câmara de São José do Rio Preto, Paulo Pauléra (PP), disse que o corpo jurídico do Poder Legislativo brigará até o STF, se for necessário, para manter a frase, que consta do Regimento Interno desde os anos de 1960. “Então, vamos brigar na Justiça até as últimas instâncias para poder manter essa tradição, que no nosso entendimento não cria nenhum problema”, declarou o vereador.