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Lula vai vetar o fim da saidinha de presos? Entenda o projeto e seus trâmites

Benefício é concedido para condenados que cumprem pena em regime semiaberto

Com 62 votos a favor e 2 contras, os senadores aprovaram, nesta terça-feira (20), o Projeto de Lei (PL) 2253/22 que determina o fim do benefício de saída temporária em feriados e datas comemorativas para presos condenados. Agora, o PL voltará para análise na Câmara dos Deputados, pois modificações foram feitas no projeto original.

Caso haja entendimento em relação às modificações, o projeto seguirá para o presidente
Luiz Inácio Lula da Silva, que pode sancionar ou vetar, no todo ou parcialmente. Se Lula
concordar, seguirá para promulgação e, por fim, vira lei; se vetar, o Congresso poderá deliberar em momento posterior.

Segundo fontes ouvidas pelo Valor, Lula convidou Arthur Lira (PP-AL), presidente da
Câmara dos Deputados, os líderes dos partidos da base aliada para uma reunião nesta quintafeira (22) para conversar sobre o assunto. O senador Jacques Wagner (PT-BA), líder do governo no Senado, afirmou que até o momento não há intenção por parte do presidente de vetar a matéria, caso fosse aprovada pela Câmara.

Relatado pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o texto previa a revogação total do benefício, mas foi alterado. Uma das emendas aceitas foi a do senador Sergio Moro (União-PR), que reverte a proibição total e permite que presos possam sair para estudar.

O que é a saidinha?

Conhecido como “saidinha”, o benefício é concedido para condenados que cumprem pena
em regime semiaberto, sendo proibido para condenados por crimes hediondos.

Atualmente, a Lei 7.210/84 permite que presos possam sair até cinco vezes ao ano e por até sete dias cada vez, sem vigilância direta, para visitar a família, estudar fora da cadeia ou participar de atividades que ajudem, de forma geral, a sua reintegração social.

É necessário que o detento tenha bom comportamento carcerário, atestado pelo diretor
do presídio, e que tenha cumprido 1/6, se for réu primário, ou 1/4 da pena se for reincidente. Cumprindo os requisitos, o juiz da execução da pena decide se a saída temporária será concedida e se o preso será monitorado com tornozeleira durante os dias que estiver fora da prisão.

O que dizem os especialistas?

Para Gustavo Batista, professor de direito penal da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o projeto não resolve, na prática, os problemas a que se propôs solucionar e pelos quais a
sociedade exige do Congresso Nacional na área de segurança.

Batista acredita, ainda, que seja impossível produzir adequadamente uma legislação
penitenciária apenas “com base nos apelos do senso comum, sem um aprofundamento
científico na área”.

“O PL pode acirrar os problemas dentro do sistema penitenciário e aumentar a zona de extorsão e predomínio das organizações criminosas que terão um ‘mercado ampliado’ para trocas e favores junto aos presos em virtude das consequências dessas novas restrições. O sistema é complexo e reage de forma bem diferente daquilo que é esperado pelo senso comum”, afirmou.

O professor vê o projeto como um problema de ordem constitucional, atingindo o princípios da individualização da pena e o princípio da humanidade e rompendo com a ótica do sistema progressivo de execução da pena, fundamentado no retorno paulatino, avaliado e merecido à liberdade.

“Ao se restringir as saídas temporárias, quebra-se com essa possibilidade de observar,
concretamente, a responsabilidade do apenado para retornar à liberdade, rompendo com o modelo constitucional de individualização da pena. A maior parte da população compreende esse ambiente apenas como locais de castigo que deveriam funcionar como verdadeiros calabouços medievais, empregando força e maus-tratos aos presos, não percebendo que isso é o que mais contribui para a ineficiência do sistema”, afirma.

A mudança provocada pelo projeto de lei pode até mesmo levar a uma discussão se o fim da saidinha seria uma violação de uma cláusula pétrea do artigo 5º da Constituição Federal. O mestre em direito constitucional pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), Joaquim Rodrigues, vê nisso um ponto negativo. “Caso aprovado, certamente teremos múltiplas ações judiciais que podem não só sobrecarregar o Judiciário, mas trazer uma certa dúvida à sociedade sobre quem efetivamente terá direito a esse benefício”, afirma.

Para Oberdan Costa, advogado de defesa criminal pelo escritório Alves Corrêa e Veríssimo,
o grande problema está no fato de que quem recebe saída temporária já está no regime
semiaberto.

“Se eles quisessem fugir, teriam fugido independentemente da saída temporária. Isso, inclusive explicaria o baixíssimo número de presos que fogem nas ‘saidinhas’: O ponto positivo do projeto, como, está, é que ele estimularia os presos a estudarem, porque essa é a única forma que restou para obter esse contato com a sociedade”, comenta.

Oberdan Costa

Segundo o Relatório de Informações Penais, elaborado pela Secretaria Nacional de Políticas Penais, entre os meses de janeiro e junho de 2023, foram realizadas 120.244 saídas temporárias em todo o Brasil, 7.630 não retornaram, tendo uma taxa de 6,4%. Na saidinha de natal, de acordo com dados do G1, 52 mil presos, 49 mil retornaram e 2,6 não.

Órgãos criticaram a proposta 66 entidades, incluindo a Defensoria Pública de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, assinaram uma nota técnica conjunta e a enviaram para o presidente do Senado. A nota analisa “profundamente o projeto de lei e conclui que a proposta pode agravar os índices de insegurança pública do país, além de trazer um expressivo impacto financeiro para a União e para os estados”.

“A dura realidade do sistema prisional brasileiro exige um debate sério, que passe dos discursos prontos, fomentadores de pânico social, invocando casos excepcionalíssimos de crimes praticados por pessoas que estavam em saída temporária e afirmações genéricas sobre a falsa necessidade de mais segurança e combate à violência. Faz-se necessário, portanto, trazer clareza ao debate em torno do real impacto do projeto de lei, que, se aprovado, será mais um obstáculo à sobrevivência das pessoas no cárcere e ao seu processo de reintegração social”, diz a nota.

O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim) também assinou a nota. Renato Vieira, presidente da entidade, classificou o PL como um “grave atentado ao sistema de
ressocialização”.

 

Fonte: Valor Econômico

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