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quinta-feira, novembro 14, 2024

Desigualdade, história e política são fatores para altas taxas de analfabetismo no Brasil

Emerson de Pietri analisa o ensino brasileiro no recorte atual e histórico, sem nunca perder de vista que “vivemos num país em que a desigualdade econômica é um traço constitutivo”

A taxa de analfabetismo na região Nordeste é o dobro da média do Brasil, e a Bahia mantém maior número de não alfabetizados, segundo um levantamento feito a partir de dados do Censo Demográfico do IBGE de 2022. São cerca de 1,420 milhão de pessoas acima de 15 anos que não sabem ler nem escrever no Estado, representando 12,6% da população. No Brasil como um todo, são 9,3 milhões de analfabetos, representando 7% do recorte.

O professor Emerson de Pietri, da Faculdade de Educação da USP, indica por onde a discussão deve começar: “Vivemos num país em que a desigualdade econômica é um traço constitutivo”. Ele complementa: “Essa realidade de desafios que nós enfrentamos historicamente se reflete necessariamente nos processos educacionais”.

Desigualdade social

O professor explica que não é nada coincidental que a menor taxa de alfabetização esteja no Nordeste, região cujo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é 0,659, frente à média brasileira de 0,758. Já o PIB per capita da região é de R$ 21.500,00, metade da média nacional. “Quando pensamos nos processos de escolarização, principalmente de alfabetização, nunca pode-se desconsiderar as condições principalmente econômicas que estão envolvidas nesse processo”, diz Pietri.

“Quando consideramos que os Estados do Nordeste enfrentam maiores desafios historicamente para se desenvolver do ponto de vista econômico, compreendemos também porque os processos de escolarização nessas regiões demoram um tanto mais para se realizarem e se consolidarem de maneira mais satisfatória”, acrescenta ele.

Processo histórico

Emerson de Pietri também comenta como essa questão pode ser entendida através do tempo. A desigualdade social entre regiões é consequência de fatores que datam desde o fim da escravidão, quando políticas de embranquecimento da população tiveram prioridade em detrimento de cuidar dos negros. “O Estado brasileiro adotou uma política de exclusão dessas populações até então escravizadas, e o que nós observamos hoje na realidade educacional brasileira é tributária desse processo que historicamente se realizou”, explica ele.

Sobre o porquê de o Nordeste ser o mais afetado, ele adiciona: “O embranquecimento do País se realizou mais efetivamente nos Estados do Sudeste. Isso também nos ajuda a compreender porque nesses Estados nós temos índices menores de analfabetismo e nos Estados do Nordeste, maiores”. Essas políticas de migração, segundo ele, garantiram o mínimo de estrutura de acolhimento para essas populações que chegaram ao Brasil; já o inverso aconteceu com as populações afrodescendentes, boa parte concentrada em Estados como a Bahia.

Demografia

Para tanto, o Ministério da Educação lançou o Pacto Nacional pela Superação do Analfabetismo e Qualificação na Educação de Jovens e Adultos. O intuito é interromper o ciclo de analfabetismo e proporcionar melhores condições de educação através do ensino público. A situação começou a melhorar no final do século passado, quando houve a difusão da educação básica gratuita.

Mesmo que várias críticas possam ser feitas ao sistema, é inegável o impacto que o oferecimento da educação pública gerou. No recorte atual, 39% dos analfabetos são pessoas que têm 65 anos ou mais e 25% têm entre 55 e 64 anos. Conforme a idade diminui, cai também a taxa: 18% entre 45 e 54 e pessoas de 15 a 19 anos não alfabetizadas representam apenas 2,4%. Ou seja, boa parte dos analfabetos são pessoas que passaram a infância quando a escolarização não era democratizada, e por isso Emerson de Pietri ressalta também a importância de continuar investindo e melhorando o serviço.

Fonte: Jornal da USP

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