Bastou um gol de bicicleta, na Série B do Brasileirão do ano passado, para mudar a vida de Guilherme Madruga, jovem volante do Botafogo de Ribeirão Preto, time do interior de São Paulo.
Tudo bem que não foi uma simples bicicleta. “Eu virei muito rápido e tirei o lance da cartola… Fiz a execução perfeita e tive mérito da bola cair por cima do goleiro”, lembra Madruga em entrevista para o R7.
A execução foi tão perfeita que rendeu ao atleta de 23 anos, nascido em São Gabriel do Oeste, interior de Mato Grosso do Sul, o Prêmio Puskás 2024.
O que significa que o gol feito por Madruga contra o Novorizontino, em 26 de julho, foi eleito o mais bonito do mundo em 2023. “É um momento surreal na minha vida.”
A entrega foi lá em Londres, na festa The Best da Fifa. Madruga teve a chance de estar ao lado das maiores lendas do futebol mundial e dar entrevista do tapete verde, por onde passam todas as celebridades.
“Quando eu fiquei sabendo que ia passar pelo tapete verde, já fiquei nervoso. Dei entrevista e minhas pernas estavam tremendo”, conta o volante.
Por lá, conversou com o capitão do penta Cafu, a rainha Marta, a craque Formiga, o goleiro Ederson. Até com Pep Guardiola, treinador do Manchester City e eleito o melhor do mundo em 2023, Madruga arriscou. “O Guardiola eu só cumprimentei.”
Na volta para o Brasil, mais um sonho conquistado. Ele foi apresentado como jogador do Cuiabá. “A Série A era um sonho pessoal e profissional, não tinha como recusar esse convite. É algo surreal disputar a Série A, a Sul-Americana”, celebra o volante.
Mesmo depois de duas semanas da entrega do Prêmio, de ele já viver na nova cidade, jogar pelo novo clube, a nova vida ainda surpreende. “Eu sinto surpresa, porque tudo parecia impossível.”
Confira a íntegra da entrevista de Guilherme Madruga:
R7 Entrevista — Você já consegue entender que sua vida mudou, você ganhou o Prêmio Puskás e agora é até reconhecido na rua?
Guilherme Madruga — Acho que não caiu minha ficha totalmente. Depois que eu lembro que só eu, o Neymar e o Wendel Lira ganhamos. Para ver a dimensão disso, só três pessoas do Brasil ganharam esse prêmio. Na estreia aqui no Cuiabá, acabei não entrando, mas eu estava aquecendo e o pessoal gritava meu nome. Eu nem tinha jogado pelo Cuiabá, ainda. Já tinha torcedor com cartaz pedindo minha camiseta, pedindo autógrafo. É um momento surreal que aconteceu na minha vida.
Como foi a festa da Fifa? Você passou no tapete verde, viu as estrelas da festa?
Passei no tapete Verde. Quando eu fiquei sabendo que ia passar pelo tapete verde, já fiquei nervoso. Porque é algo surreal. Até chegar no prêmio, eu chorei dentro da van, eu gritei. Foi uma mistura de emoções, eu aproveitei ao máximo. No tapete verde eu dei entrevista e minhas pernas estavam tremendo de nervosismo.
E você falou com outros jogadores lá tem essa possibilidade ou não?
Eu falei um pouco com o Rúben Dias [jogador português do Manchester City]. Tinha uma brincadeira que ele fez 14 pontos, mas era muito difícil de fazer. Eu fiz 11 e falei para ele que era mentira. Antes da festa, só consegui falar só com ele mesmo. Eu só falo português, então consegui falar com o Ederson em cima do palco, porque todos os vencedores subiam para tirar a foto oficial e a gente conversou um pouco no palco. O Guardiola eu só cumprimentei. Outras lendas, como o Cafu, a Marta e a Formiga eu conversei bastante no hotel e no aeroporto. E agora admiro ainda mais eles.
Você foi sozinho?
Fui eu e meu irmão. Meu irmão ficou impressionado, era o sonho dele conhecer Londres e por coincidência foi lá a premiação. Ele estava fascinado com tudo, qualquer tempinho a gente saía para passear. Depois da premiação, a gente sentou no restaurante que era só para o pessoal da FIFA, e ficou lá olhando tantos jogadores, tantas pessoas com tanta influência no futebol. A gente não queria sair mais restaurante
Como o futebol entrou na sua vida?
É uma paixão no meu pai. Ele queria esse sonho, só que, por conta das dificuldades financeiras, ele teve que trabalhar muito cedo e ajudar a família em casa. Não conseguiu realizar esse sonho. Somos do Mato Grosso do Sul e lá é bem difícil essa oportunidade. Ele passou esse sonho para mim e para o meu irmão.
Fui criado no interior do Mato Grosso do Sul e todos os dias que ele jogava bola, levava a gente, mesmo recém-nascido. Ele e minha mãe levavam um colchão e a gente dormia nos campos nesse colchão. Ele dava de presente para nós uniforme de time, bola de futebol.
Você começou mesmo no handebol?
Eu tinha muita facilidade em todos os esportes. Então, eu praticava de tudo: tênis, handebol, vôlei. Na época com 12, 13 anos, a febre que estava era handebol, todos os meus amigos na infância todos praticavam e também tinha investimento da cidade. A gente viajava para disputar campeonato estadual, regional. Eu gostava muito de ser menino e viajar com meus amigos e praticar o que eu gostava. Por isso gostava tanto do handebol.
Quando você optou por tentar o futebol?
Tive a oportunidade de mudar para Campo Grande, para capital, atrás do sonho de ser jogador de futebol. Eu fui morar com meus avós. Saí do interior para ir atrás de oportunidade e começou meus passos na carreira.
Fala a verdade, você treina bicicleta?
Treinar, treinar eu não treino. É muito difícil ter um treino específico para dar bicicleta. Não tem nem como. Aquele foi um momento que a pessoa pensa, imagina, foi mais psicológico mesmo. Eu me imagino fazendo. Naquela hora foi um momento assim. Eu virei muito rápido e tirei o lance da cartola. Acho que por imaginar essas possibilidades acabou acontecendo.
Quando você fez o golaço de bicicleta que rendeu o prêmio, precisou olhar de novo para ver se a bola entrou mesmo?
Eu nunca imaginei na minha vida ganhar o Prêmio Puskás. Só que logo depois do jogo teve a entrevista e me falaram que estava subindo a #madrugapuskas. Ali, comecei a sonhar e criar expectativa e vi a possibilidade, já que é um gol muito difícil de acontecer. Também a forma que fiz o movimento todo correto. Não parecia que foi sorte, eu fiz a execução perfeita e tive mérito da bola cair por cima do Jordi [goleiro do Novorizontino].
Como foi a transferência para o Cuiabá e jogar pela primeira vez em um time da Série A do Brasileiro?
Eu estava feliz em Ribeirão Preto, só que sempre queremos buscar melhor melhores opções, melhores lugares e aqui me proporciona melhor visibilidade. A Série A é um sonho pessoal e profissional, não tinha como recusar esse convite. É algo surreal disputar a Série A, a Sul-Americana. Espero que seja um ano maravilhoso, igual foi pelo Botafogo em 2023.
Financeiramente, a sua vida está melhor, você consegue ajudar seus pais? Você conseguiu ter um respiro?
Melhorou, porque dei um pulo para Série A. Mas ainda não consigo mudar totalmente a vida dos meus pais. Mas tudo aconteceu tão rápido que acho que é só o início. Meus pais ainda trabalham, só que espero um dia que eles possam viver comigo e meu salário sustentar a casa toda.
Quando você olha para aquele menino lá no interior do Mato Grosso do Sul e ver onde você tá hoje. O que você sente?
Surpresa, porque parecia impossível. Todos na minha cidade ficam admirados. No final do ano passado fui na escola onde eu estudei. Vi as crianças gritando meu nome e vi que elas realmente estavam felizes comigo. Me deixou grato e demonstrou que eu estou no caminho certo, influenciando a criançada a buscar seus sonhos. Falei para eles que parece impossível a gente aqui no interior do Mato Grosso do Sul, mas nada é impossível para gente que busca, que vai atrás dos nossos sonhos.